Ontofania Digital - O digital como estrutura de percepção

  • Cristian Rodriguez Auckland University of Technology
  • Marcos Steagall  (Translator) Auckland University of Technology

Resumo

Poucas pessoas hoje em dia contestariam o argumento de Negroponte, de que a revolução digital acabou. Não porque a revolução tenha falhado de alguma forma, mas porque já tocou a todos. No entanto, nesta paisagem pós-digital, vários campos diferentes ainda estão discutindo como esta presença onipresente de tecnologias digitais pode ser enquadrada conceitualmente. Alguns teóricos alinham-se por trás de ideias que se assemelham ao modelo de realidade mista de Milgram e Kishino (1994), onde o virtual e o real são representados como um continuum, que engloba o ambiente virtual em uma extremidade e o real na outra. Outros ainda preferem o que Jurgenson (2009) chama de dualismo digital, onde o mundo digital é visto como virtual e o mundo material como real; como reinos separados e diferenciados. Ontophany Digital (Vi al, 2018) argumenta, de uma perspectiva metafísica, que, embora se possa concordar com a ideia de uma única realidade contínua com propriedades diferentes, um conceito central é que as tecnologias ao longo dos séculos geraram mudanças na maneira como percebemos as coisas (mudanças ontofânicas), que abalam as estruturas dominantes de percepção. Estas mudanças estão intimamente relacionadas às capacidades tecnológicas de trazer as coisas à existência, e têm o poder de mudar nossa ideia do que é a realidade. Dispositivos tecnológicos, portanto, tornam-se condições de possibilidade para a realidade (Vial, 2019), organizando a história da humanidade em uma série de sistemas tecnológicos. O sistema pré-mecânico do Renascimento e o sistema mecânico industrial são exemplos deles, que criaram não apenas seus próprios processos de produção, mas, também, conjuntos particulares de práticas sociais. A irrupção da revolução digital dos anos 1970-90 trouxe um novo sistema: o sistema tecnológico digital. As tecnologias digitais, caracterizadas pela introdução de simulações, avatares e relacionamentos mediados pela Internet, causaram um choque fenomenológico em nosso ser-no-mundo (industrial). Para sobreviver a esse trauma ontofânico, criamos a distinção entre os mundos virtual e real, regidos por suas próprias regras fenomenológicas. Rejeitando este dualismo, Digital Ontophany define o ser como uma construção antropo-técnica, onde os objetos materiais medeiam crenças, hábitos e agências. Deste modo, a revolução digital torna-se um acontecimento filosófico, no sentido de que afeta nossa experiência fenomenológica do mundo. O surgimento do digital não é apenas uma questão de ontologia, mas de ontofania, pois define como os seres (ontos) aparecem (phaino). As tecnologias digitais, portanto, são estruturas de percepção que criam matrizes ontofânicas e as condições materiais que determinam as manifestações fenomênicas que lhe são exclusivas e particulares. Não é apenas uma mudança de materiais e dispositivos, mas a transformação do próprio ato de percepção e de sua dinâmica fenomenológica. Na perspectiva da teoria da cognição, de Santiago, a ontofania digital oferece uma sensibilidade única para analisar a dinâmica de acoplamento estrutural evidenciada nos processos de interação entre o organismo (o aprendiz) e o ambiente na produção de uma experiência única de usuário, que transforma os dispositivos digitais em máquinas filosóficas, condições de possibilidades e geradores de realidade (Vial, 2019).

Publicado
2021-12-05